– Série – Eu e Tu

O RELÓGIO…

… bate nas 9 da noite. Está quente lá fora. Há um telheiro aberto para uma vista desafogada sobre um monte de oliveiras em pleno baixo Alentejo. Há velas acesas. Laurinda serve um copo de vinho na cozinha e encosta-se na porta que dá para o exterior.
– Que bela noite de verão. – comenta Carlos, seu marido. Está em risco de vida há 2 anos. Os médicos dão-lhe apenas 1 mês.
– Deixei-te na sala por uma razão. Não creio que tenha vontade…
– De falar comigo? De me ver? De me dizer que não me amas? Qual é a vontade de hoje?
– Beber o meu copo de vinho e querer ver-te morrer. É só isso.
– Dizes-me a mesma coisa há 2 anos. Não me apoias e não te divorcias para não ficares mal vista entre as tuas amigas. Deixas-me entregue a Deus.
– Poupa-me, Carlos. Esses teus pleonasmos não me alimentam a fome. – Laurinda entra na cozinha. – Queres vinho?
– De que ano?
– Importa-te? Morres daqui a 1 mês. É assim tão necessário saberes o ano de um simples vinho que pode muito bem ser o teu último?
Carlos puxa uma cadeira e senta-se com dificuldade. O cancro que lhe afeta o sangue fá-lo perder a mobilidade e a flexibilidade, apesar de continuar lúcido.
– Dá-me um último prazer na vida que é saber o ano do vinho que vou beber…
– 2016. Alentejano. Sirvo um copo?
– Por favor.
– Espero que gostes. Ainda te faço estas coisas porque gosto de pensar que estou apaixonada por ti como da primeira vez.
– Ainda te lembras?
– Prefiro esquecer.
– Fazemos hoje 50 anos de casamento. Podíamos estar na igreja a celebrar as bodas de ouro, mas nem isso te satisfaz. Estares comigo é um fardo que alimentas há anos.
– No início, Carlos, é tudo tão bonito, não é? Estamos apaixonados, queremos casar, constituir família…
– O vinho é bom. Ótima escolha.
– Depois as coisas pioram com o tempo. Sexo faz-se cada vez menos e tesão um pelo outro desvanece…
– Sentes alguma coisa por mim? Hoje.
– Ontem sentia… ódio. Hoje sinto… repulsa. Queres que continue?
– Por que é que te tornaste assim? Ácida e parrascana? Sou teu marido, mal me mexo e continuas a contar as pedras para construíres os muros do meu caixão.
– Sabes o que vejo quando olho para tudo isto?
– Mal jantaste, mal me dirigiste a palavra, já não há beijos… e dormes num quarto separada de mim. És uma Laurinda…
– Não preciso que me descrevas, muito menos o estado da nossa relação.
– Olho para isto e penso que o conquistámos…
– Por favor, Carlos, por favor… – Laurinda levanta-se e encosta-se ao lavatório da cozinha com o copo de vinho na mão. – Não me faças de parva. Sabes muito bem que essa conquista de que tanto falas não passa de uma fachada.
– E se a tentarmos manter até ao fim?
– EU QUERIA UM FILHO! – Laurinda parte o copo na bancada e chora. – O que é que me deste? Dinheiro, dinheiro, dinheiro… eu não queria dinheiro! Eras o empresário do século e depois?
– Estava a construir o nosso futuro.
– Cala-te. Não pedi nada disto. Só queria ser feliz e amar-te.
Silêncio.
– Não sei se quero mais vinho. – diz Carlos.
– Os nossos pais morreram a pensar que éramos felizes, os nossos amigos pensam que somos o melhor casal do mundo… para quê? Explica-me?
– Todos erramos…
– Erraste na primeira chapada que me deste, erraste na primeira vez que me disseste que eu não podia sair de casa, erraste na primeira vez que me fizeste acreditar que ter um império de milhares de euros era mais importante do que ter uma família…
– Estou a pagar pelo que te fiz.
– As coisas podiam ter sido tão diferentes. Tenho 75 anos, tu tens 78… e afinal? O que é que guardamos?
– As memórias, os…
– Cansas-me! Cansas-me com os teus pensamentos básicos e idílicos de não sei o quê…
– Laurinda… tudo o que fiz…
– Foi por amor, é isso? As noites que passei no hospital depois de me esbofeteares foi por amor?
– Tudo o que fiz… não o voltaria a fazer.
– Carlos, diz-me uma coisa…

A NOITE…

… já leva mais uns minutos em cima. Ela encostada na bancada à espera de respostas, ele sentado na cadeira com os braços apoiados na mesa de jantar.
          
– Não apanhas os vidros? Ainda te vais cortar… – diz Carlos.
            – Uau! Preocupado comigo. Nem parece teu. Tens a certeza que os comprimidos estão a fazer efeito?
            – 50 anos… de casamento… pedia-se… tão mais.
            – Ainda não respondeste à pergunta que te fiz…
            – Não, nunca te traí. Mas, porquê? Mudava alguma coisa agora?
            – Tenho 75 anos e continuas a passar-me atestados de burrice.
            – Mudava alguma coisa? Responde, tu. Quero saber.
            – Não mudou nada quando descobri que andaste a picar fora do ninho. Estou contigo, porque pensava que te amava… ou se calhar amo atnto que me tornei cega.
            – Onde vais buscar tantas certezas?
            – A Clara contou-me tudo quando a fui ver ao hospital. Que perfeita cena de novela… e eu em casa a tomar conta do era “nosso”. 
            – Todos temos os nossos deslizes e, que eu saiba, não foste a santa que tanto apregoas por aí.
            – Serei sempre a mal vista… sou mulher e sou casada. Queres mais argumentos?
            – E agora?
            – Queres que te faça um desenho?
            – Quem somos e onde chegámos? Tanta busca pelo dinheiro e afinal…
            – Só há um culpado. E sabes bem que és tu. – Laurinda senta-se ao lado do marido.
            – Gosto tanto quando te sentas ao meu lado. Ainda te lembras do dia do nosso casamento?
            – Tudo por água abaixo…
            – As flores eram para ser brancas e afinal foram vermelhas, o padre não chegou a tempo e os convidados foram mais dos que aqueles que convidámos. – Carlos ri-se a recordar os momentos.
            – Tivemos de ir buscar frangos a uma churrasqueira próxima da igreja. Que desastre…
            – A tua mãe! Meu Deus! Estava tão bêbeda que não se aguentava em pé…
            – E o teu pai? Que foi buscar o trator para a levar para casa? – Laurinda desmancha-se em gargalhadas.
            – Ficámos só os dois no salão do baile a dançar com o senhor da banda. Foram todos ver se a tua mãe ficava bem. Foi tão especial…
            – Eras um homem perfeito. Eras aquele com que sempre sonhei casar. Havia mais cá na aldeia, mas tu eras o tal.
            – As nossas famílias sempre se deram bem.
            – Tentaram juntar-nos desde o primeiro dia e lá conseguiram.
            – E quando te pedi em casamento estava uma esturrina que tiveste de ser tu a ir buscar-me um copo de água gelada para não desmaiar.
            – E agora? – pergunta Laurinda.
            – Fiz-te a pergunta há pouco. Tens de ser tu a responder.
            – Anda tu primeiro.
            – Não me desafies…
            – Senão fazes o quê?
            Ficam ambos frente a frente, entregues nos olhos um do outro. Ali veem tudo. Nada fica por dizer, mas têm vontade de dizer tudo. Entregam-se e beijam-se sem remorosos. Boca com boca.
            – Era isto que me querias dizer? – pergunta Laurinda.
            – Sinto saudades… muitas.
            – De dormirmos juntos? De sermos casal?
            – Sem culpas.
            – Perdemos tanto tempo da nossa vida a discutir e tentarmos ser melhores. Competíamos para chegar a lado nenhum. Afinal, o que temos hoje?
            – Laurinda, deixa-me fazer-te feliz nos dias que me faltam.
            – Não sei se mereces o meu perdão.
            – Estou acabado, sem chão, com um prazo de validade… já estou a pagar pelo que te fiz. Dá-me pelo menos essa última chance.
            – Tenho de ir apanhar os vidros.
            – Foges sempre à minha doença, como se já não tivesse a sofrer demasiado com ela. Por favor, ajuda-me. Pelo menos isso.
            – Estou cansada, Carlos, muito cansada.
            – Não estás mais do que eu.
            Laurinda apanha os vidros com uma vassoura e uma pá.
            – Sirvo-te qualquer coisa?
            – Podes pôr mais do vinho que me serviste.
            – Vamos até lá fora? Quero mostrar-te uma coisa.
            – Ajuda-me a levantar.
           

LÁ FORA…

…no extenso telheiro que dá para uma vista completamente desafogada sobre um campo de oliveiras e umas vinhas bem tratadas, é de noite e pouco se vê, mas os dois têm noção daquilo que construíram ao longo dos anos. Sentam-se numas cadeiras de madeira teca que ali estavam.
          
– É isto. – comenta Laurinda.
            – O quê?
            – A minha vida ao teu lado.
            – Foi assim tão exaustiva?
            – Não mexi uma palha. Não sei se te recordas, mas estava enfiada no escritório a tratar das papeladas financeiras.
            – Eu estava fora, e tu sabes disso.
            – Não era ali que eu queria estar.
            – Havia trabalhadores, empregados… eras a dona de tudo isto. Querias ter estado onde?
            – Olho para este vinho e… não o sei avaliar.
            – Prova, sente… a que te sabe?
            – A vinho.
            – Então porque bebes?
            – Li algures, num dos milhentos livros que me passaram pelas mãos quando estava sentada naquele sofá enfiada na sala…
            – A mesma conversa, sempre…
            – Li que… mais vale uma bebida nobre na mão do que um copo de água mal servido.
            – E ao fim de tantos anos a beber vinho, não consegues dizer-me a que sabe?
            – Estas vinhas cheiram a mãos que não lhes toquei. Mas fui aprendendo, com a vida. Este vinho que agora bebo sabe-me… a… saudade.
            – Nem um toque frutado no fim? A boca fica áspera e o paladar abre.
            – Não tenho experiência de enólogo.
            – Este projeto também é teu.
            – Não.
            – Porquê?
            – Porque não sinto, nunca o senti. Nunca o sentimos, na verdade. Eu e Tu. Nós. O que é feito de nós? Dois velhos, acabados, à luz das velas a beber vinho na noite em que comemoramos os nossos 50 anos de casamento… que romântico!
            – Achas?
            – De todo! Lamechice pegada…
            – Sempre azeda.
            – Sabes, Carlos… eu casei contigo por amor, mas não sei se vou morrer por amor.
            – Dizes-me isso há meses. Desde que descobri a doença.
            Laurinda dá um gole na bebida.
            – Ontem fui ao médico…
            – Sim, foste comigo.
            – Enquanto estavas no tratamento de quimioterapia, eu estava com o doutor Fausto. Disse-me que tenho uma insuficiência pulmonar. Seja lá o que isso queira dizer…
            – Porque não me disseste?
            – Descobri ontem. O que havia para dizer?
            – Estamos sozinhos, não estamos?
            – Queres que te confirme ou que tente uma explicação mais elaborada?
            – A segunda.
            – Muito bem… neste momento… estás a ver os teus filhos, aqueles que te amam muito.
            – E mais?
            Laurinda faz uma pausa e foca na vista que tem em frente.
            – São tão bonitos. Dizem-te para teres cuidado, para te apoiares nos meus braços e…
            – E…?
            – E que a mãe sempre teve razão.
            – Nunca diriam isso. – Carlos bebe.
            – Disseram e não estavam muito contentes. Dizem que és muito refilão e foste um péssimo marido.
            – Estás a inventar…
            – Dizem que foste bom pai e… abraçam-te. – Laurinda olha para Carlos, que está petrificado na cadeira. – Não lhes dizes nada?
            – Não sei se quero. – Carlos vertes algumas lágrimas.
            – Abraça-os vá. – Laurinda dá-lhe um jeito nos braços. – Diz-lhes o quanto os amas, o quanto davas para eles aqui estarem, o quanto deviam estar a fazer-nos companhia e… o quanto tu davas para os teres visto nascer.
            – Não me faças isto.
            – Estou grávida de nada… nem virtude nem salvação. Angústia pura.
            – Teria sido o melhor pai do mundo. – Carlos retira-se para dentro de casa com dificuldade.

DENTRO DE CASA…

… na sala, Carlos pousa o copo por cima da mesa de centro junto aos sofás e tira, de uma das estantes, um disco de vinil, que põe a tocar no gira-discos. Sentam-se e saboreia o resto de vinho que ainda tem no copo.

            – A ouvir Nat King Cole? – Laurinda olha para o marido encostada à ombreira da porta da sala.
            – Estou a aproveitar os últimos minutos de vida.
            – Pessimista…
            – Sincero.
            – Alguma crítica? Estás a virar o jogo, é isso?
            – Que jogo? O dia do nosso casamento?
            – Festejamos 50 anos de casamento, nunca ligaste à data e hoje estás particularmente chato em relação ao acontecimento…
            – Talvez por ser o último ano que o passamos juntos?
            – E porque não fazemos isso acontecer? – Laurinda aproxima-se do sofá. – Podíamos deixar rolar o clima ao som desta voz lindíssima.
            – E a razão?
            – Tem de haver?
            – Como no nosso casamento? Em que estávamos, assim, agarrados um ao outro só a dançar…
            – E toda a gente a ver… que vergonha.
            Laurinda e Carlos dançam calmos, um com o outro, ao som da canção que entoa pela sala.
            – Acho que sempre estiveste muito bem. – diz Carlos.
            – Não digas disparates.
            – Lembras-te de quando dançámos pela primeira vez?
            – Tão bem, como se estivesse a acontecer agora. E eu era tão apaixonada por ti. Os teus pais bem me diziam que não eras boa influência, mas lá queria saber.
            – Orgulhas-te de estares comigo?
            – Como queres a resposta?
            – Honesta.
            Laurinda aproveita o momento para beijar o marido e deixar-se envolver pela dança.
            – Está respondido. Chega?
            – Um beijo nos lábios não responde a tudo.
            – Tens a certeza?
           – E, então, quer dizer que o nosso jantar termina assim, é isso?
           – Diz-me tu.
           – Não temos idade para mais, Laurinda.
           – Tu não tens…
           – E tu tens?
           – Acho que sim. Quer dizer… há quanto tempo?
           – Meu Deus… há… anos?
           – Quem te ouvir não diria que somos um casal. Um pouco exagerado, não?
           – Como é que vai ser o meu funeral? Já pensaste?
           Laurinda abandona a dança e volta a pegar no copo de vinho que apoiou numa estante de livros ali perto.
           – Não sei se me apetece falar disso.
           – Calma… também não te queria deixar nesse estado.
           – Eu sei que te tenho tratado muito mal, mas não quer dizer que te queira morto e acho que estes dias têm sido muito duros para mim.
           – Não tens de te culpar.
           – Tenho, porque não fui a melhor esposa que podias ter tido ao teu lado. Foram milhares as festas da empresa a que faltei, foram milhares os jantares que não fiquei até ao fim, foram milhares as desculpas que te dei sem sentido…
           – E perdoas-me pelo que te fiz?
           – Não.
           – Então porque te desculpas?
           – Não me desculpo. Arrependo-me.
           – Se soubesses…
           – Se soubesse de tudo nunca teria casado contigo, mas se formos por aí… também estaríamos morto se não tivesses aqui comigo agora.
           – Não te percebo, talvez foi por isso que a nossa chama se apagou.
           – Ah! Afinal houve algo que se apagou. Sempre soube, só queria confirmação.
           – Estás doente, Laurinda, e não é só sobre os teus pulmões.
           – Eu amei-te, tenho orgulho em ti…, no entanto, hoje, não há motivos que me façam estar apaixonada por ti, mas continuo a amar-te, porque tenho uma missão contigo. Eu prometi que estaria ao teu lado até que a morte nos separasse.
           – Não precisas de esperar mais tempo.
           – Sei que não. Mas não me impressiona a solidão. Vou morrer sozinha… não sei se quero.
           – Talvez seja o nosso final mais feliz. Cada um à sua maneira, sem grandes alaridos.


1 DA MANHÃ

… e os grilos já não cantam. Os animais recolheram de vez e nem uma pinga de vento. A noite continua quente, o relógio dá toques a cada segundo e Laurinda lava os copos onde serviu o vinho.

            – A lavar a loiça? – pergunta Carlos.
            – Os copos do vinho, para não haver quaisquer vestígios.
            – Vestígios?
            – De uma noite estranha.
            – Intensa também.
            – Podes usar qualquer adjetivo. Por mim, hoje, está feito. Levanto a mesa amanhã.
            – Já te vais deitar?
            – Porque não? É tarde, estou cansada…
            – Levas-me contigo?
            – Dormes comigo?
            – Sim, por favor…
            Os dois sobem aos quartos e fazem a rotina de higiene pessoal.
            – Estou velha.
            – Já tens 75, pior estou eu.
            – Nunca pareceste muito novo, a bem dizer.
            – Obrigado pelo elogio. Posso deitar-me?
            – Se já aí estás. Do que esperas?
            – Estás chateada comigo?
            – Porque haveria?
            – Por todos estes anos…
            – Acho que já te tinha respondido a isso.
            – Sabes… estou com saudades de tanta coisa que não vivi e de tanta coisa que não fiz ao teu lado. 
            – Arrependes-te no fim da linha? – Laurinda apaga a luz da casa de banho e senta-se na cama.
            – Só tenho de aceitar que é assim.
            – Em nome do pai, do filho e do espírito santo. Amém. – Laurinda aproveita para se benzer antes de se deitar.
            – Não sabia que eras tão religiosa. Nunca fizeste isso à minha frente.
            – Não dormes comigo há meses… como tens tanta certeza disso?
            – Revoltaste-te contra Deus quando os teus pais morreram. Prometeste que nunca mais irias a uma missa nem a uma igreja.
            – Cumpri?
            – Sim.
            – E então?
            – Agora benzes-te…
            – Chegamos a uma fase da nossa vida que temos de nos agarrar à fé, para nos perdoarem de muita coisa. É só aquilo que estou a fazer… a agarrar-me a Deus.
            – Já o perdoaste?
            – Talvez… é terapêutico.
            – Obrigado.
            – Por?
            – Por me teres aceitado aqui na tua cama…
            – Nossa cama. Não te esqueças que dormimos aqui 50 anos. Tudo bem que eram camas diferentes, mas é a mesma companhia.
            – 50 anos de casamento. Uma vida inteira.
            – Só quero que saibas, Carlos, que tudo aquilo que fiz foi por amor.
            – Isso é uma despedida?
            – Uma lembrança. E que nunca te esqueças que aquilo que vivemos foi inteiramente mágico. Perdeu-se depois… paciência.
            – Eu nunca deixei de te amar.
            Os dois voltam a beijar-se com as duas lâmpadas dos candeeiros acesas.
            – Fomos eu e tu?
            – Somos eu e tu. Dá-me um abraço? – diz Laurinda.
            Abraçam-se.
            – Dormimos? – diz Carlos. – Laurinda…? Laurinda…?
            Ela está de olhos fechados e deixa-se cair na almofada. Carlos tenta perceber o que se passa e desespera sem saber o que fazer. Ainda sente alguma respiração na boca, mas fraca. Tenta chamar por ela, mas sem resposta.
            – Para de fingir, por favor, Laurinda. Não me deixes assim, nervoso.
            A luta continua, no entanto sem sucesso. Carlos chora sem saber como agir.
            – Não me podes fazer isto. Era eu que tinha prazo de validade. Laurinda? Hoje, não… por favor… Laurinda…?
            Carlos pega no telemóvel para pedir ajuda e ali ficam, os dois, à espera. Eles.

FIM

(Esta série é uma obra de ficção escrita, por isso qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência).