Cartas ao Pai Natal

Carta 1

Querido Pai Natal,

Escrevo-te esta carta sentado numa cadeira da mesa da cozinha. Está de noite, são 11 horas, está a chover e estou sozinho em casa. Os meus pais saíram, como habitualmente fazem a estas horas. Não sei o que tanto procuram lá fora, mas deixam-me sempre trancado em casa, porque eu não posso sair com eles. Dizem que é perigoso. Já me cansei de perceber.

Chegam a casa de madrugada, eu estou a dormir e só os oiço discutir no quarto. O meu pai André fica furioso porque o meu pai Tiago convida os amigos cá para casa sem a autorização dele. É apenas aquilo que consigo ouvir do meu quarto. Às vezes também levo uma chapada ou outra porque não tiro boas notas e eles querem que eu tenha uma profissão de prestígio, mas estou apenas no 10º ano. Tudo bem que já tenho de ter uma ideia daquilo que quero, mas sofro com pressões todos os dias e estou cansado.

Na escola gozam comigo por ter dois pais, batem-me por não conseguir ter ninguém, humilham-me por gostar de artes e vivo numa sociedade invisível aos problemas que realmente importam. Odeio fazer-me de vítima, mas não estou bem e não me sinto capaz de viver a minha própria vida, a vida que não escolhi. E agora? O que é que eu faço? Já pensei em desaparecer e de certeza que era o melhor para mim e para todos. Ninguém daria conta.

Pai Natal, se me ouves, aí de onde estás, preciso da tua ajuda. Preciso de ti. Preciso que me dês uma palavra de conforto, preciso de um abraço que nunca tive, preciso de ser amado como nunca me amaram. Pai Natal, por favor, só te peço um único desejo neste Natal, que não vou ter mais um ano, porque o meu pai André vai estar bêbedo e violento e o meu pai Tiago a encher a sala de tabaco, peço-te isso, que me possas dar a capacidade de sonhar outra vez.

Sabes? Nunca disse que te adorava, porque nunca te conheci, mas quero tanto acreditar que és real e que me vais responder, nem que seja com aquela esperança lá no céu no dia de Natal.

Espero por ti.

Paulo Silva 

 

Carta 2

Querido Pai Natal,

Chamo-me Alexandra, tenho 23 anos e… não sei muito bem como te dizer isto. Aliás, não te digo nada desde os meus 8 anos e nessa altura era com desenhos porque não sabia escrever muito bem o que te pedir. Tive uma vida tranquila. Nunca me faltou nada, tinha casa, comida, onde dormir, amigos que me amavam… como qualquer outra criança normal do meu tempo.

Mas as coisas mudaram nestes últimos dois anos. Os meus pais emigraram e deixaram-me uma carta de despedida, dizendo que já tinha feito 18 anos e que já podia fazer a minha vida sozinha e que, qualquer coisa que precisasse, os meus avós tomavam conta de mim. Sim, tudo bem que nos últimos tempos a minha relação com os meus pais não era a melhor, eu também não me portava muito bem na escola e acabava por ser uma miúda revoltada com tudo o que me rodeava. Não sei se consigo perdoar os meus pais ou se alguma vez eles vão regressar para me ver, mas também já não quero saber. Eles desligaram completamente.

O meu avô morreu de desgosto pelo abandono dos filhos e estou a viver sozinha com a minha avó há 4 anos. Ela tem vindo a piorar da doença respiratória mês após mês. E enquanto te escrevo esta carta, olho para a minha avó ligada às máquinas de um hospital entre a vida e a morte e é muito duro para mim e para ela. O que é que eu faço? Se a minha avó morre, fico completamente sozinha…

Sabes? É quase Natal e só te queria pedir que a minha avó me desse um último abraço e me dissesse o quanto me ama e sou importante para ela. O quanto está orgulhosa de mim e o quanto lutámos as duas para não desistirmos uma da outra… Só um abraço. É a única coisa que quero neste Natal. E depois logo se vê… vai ficar tudo bem, eu acredito.

Não te esqueças de mim.

Com muito amor,

Alexandra.